Questão de sentimento.

- Talvez seja questão de sentimento. – ela disse.- Talvez.Na verdade ela não sabia.Mas sentir já era, essencialmente, inexplicável. Sentir implicava em conformar-se, da mesma maneira com a qual nos conformamos com as coisas que não podemos controlar. Sentir era o resumo e o conjunto de tudo, porque levava todas as causas para um desfecho comum.“Questão de sentimento” parecia a peça perfeita de encaixe. Parecia a solução final de um enorme cálculo de incógnitas, e, ironicamente, dispensava qualquer lógica.- Me parece óbvio.- Talvez não me pareça – ele disse – porque talvez as coisas não possam ser óbvias e ao mesmo tempo sentimentais.- E o que elas seriam então? – ela perguntou.- São aquilo que escolhemos que sejam.Parecia mais fácil ouvindo-o falar assim.Uma mera escolha entre possibilidades.O óbvio era um domingo de sol. O sentimento era a sensação de recomeço num dia qualquer de quarta-feira. O óbvio da lâmpada era a luz; o sentimento era o gênio com seus três desejos. O óbvio era um uniforme. O sentimento era uma nova extravagância. O óbvio era a lei da atração entre dois opostos. O sentimento era a procura dos ajustes entre as pequenas diferenças.Óbvio se planejava. Sentimento acontecia.- É a primeira vez que penso assim – ela disse – e nunca imaginei que seriam razões tão contrárias. Como cinza ou azul.- E qual você escolheu?Ela pensou sem necessidade. Pelo hábito de parar e pensar, mesmo que qualquer um pudesse adivinhar a resposta.- Escolhi o azul.E ele a olhou e sorriram.Questão de sentimento.

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